DESCRIÇÃO E ANÁLISE DA TOPONÍMIA DAS CARTAS DE SESMARIAS DO CEARÁ NOS SÉCULOS XVII E XVIII (1679-1746)
Elis Larisse Santos Gonçalves
Resumo:
A presente tese tem o objetivo de analisar o sistema toponímico do Ceará nas cartas de sesmarias dos séculos XVII e XVIII, especificamente entre os anos de 1679 e 1746, período de grande efervescência da expansão colonial cearense por meio da distribuição de terras através do sistema sesmarial. Para alcançar tal intento, fundamentamo-nos na proposta teórico-metodológico formulada por Dick (1980, 1990) e, a partir da classificação e análise das categorias do modelo taxionômico, tecemos uma investigação quali-quantitativa do nosso corpus de pesquisa, composto por 412 topônimos, que foram coletados dos documentos históricos Cartas de Sesmarias, editadas e publicizadas pelo Arquivo Público do Estado do Ceará (APEC). Assim, como fundamentação teórica desta tese, nos apropriamos da perspectiva de léxico como uma construção cognitivo-social abordada por Marcuschi (2015) e dos estudos de Dick (1980, 1990), que construiu os pilares para a análise toponímica, levando em consideração a realidade brasileira. Além disso, considerando que, conforme Dick (1990, p. 16), a Toponímia é um “imenso complexo línguo-cultural”, propomos o estabelecimento de interseções com os estudos culturais (LARAIA, 1989; WILLIAMS, 2015), com os estudos de identidades culturais (HALL, 2014; WOODWARD, 2014 e SILVA, 2014), política e poder (FREITAS, 2006). De acordo com as análises empreendidas nesta tese, a maior parte dos topônimos em uso no período advém de línguas indígenas, fato que colaborou para que o campo de experiência de Natureza Física se sobressaísse com relação ao campo de Natureza Antropocultural, sobretudo as taxes dos Zootopônimos, Fitotopônimos e Hidrotopônimos, o que nos levou a tecer uma discussão acerca da relação de continuum estabelecida entre grupos humanos e a natureza, a partir da perspectiva epistemológica indígena com base em Krenak (2019), Kopenawa e Bruce (2023). Não obstante, nas expressivas ocorrências do campo de Natureza Antropocultural, destacamos a produtividade da taxe Ergotopônimo, que se refere a elementos da cultura material. No caso dos resultados desta tese, ganharam relevo no texto toponímico artefatos materiais das culturas indígenas, demonstrando a relevância destes na construção simbólica do espaço geográfico cearense. Entretanto, foi a partir da análise da introdução de Antropotopônimos e de Hagiotopônimos no léxico toponímico do período colonial que percebemos, de modo mais latente, mudanças na “ordem social” (WILLIAMS, 1992) estabelecida até então pelo uso das taxes de Natureza Física anteriormente citadas, uma vez que o processo de estabelecimento da cultura europeia, por meio do projeto colonizador, começou a reverberar nos usos toponímicos do período em análise, revelando mudanças no padrão denominativo que denotam a construção de novos símbolos identitários no contexto, e o estabelecimento de outra cultura dominante, bem como as relações de poder que passaram a perpetuar-se a partir da égide colonial. Como contribuição desta tese aos estudos toponímicos, a análise do nosso corpus de pesquisa nos permitiu a proposição de uma nova categoria taxionômica à proposta teórico-metodológica de Dick (1980), taxe que denominamos de Fossiotopônimo, relativa aos topônimos que remetem ao processo arqueológico de fossilização, agregando novas possibilidades motivacionais ao escopo teórico da Toponímia brasileira.
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