PERSPECTIVAS DA FILOLOGIA TEXTUAL
INTRODUÇÃO
A filologia textual é cada vez mais, comprovadamente, um instrumento de grande importância para o estudo lingüístico. Nesse momento é o texto que nos leva aos dados da língua. Desde os primórdios dos estudos da linguagem até finais do século XIX, tem sido o texto o documento dos fatos de língua. Mas, como se tem acentuado recentemente, também para grande parte desses dados é necessário fazer o estabelecimento do texto (BlancheBenveniste, 19981 ): estabelecimento de texto, manuscritos - antigos ou modernos - , de inquéritos gravados, de toda espécie de documento de língua. Desse modo, o método filológico apóia a análise lingüística, ao fornecer com critérios um texto fidedigno. Por outro lado, elementos lingüísticos do texto estabelecido permitem - e têm sempre permitido - estudar a língua aí documentada.
O que seria então esse texto? É preciso, então, ter em mente que a noção de texto, compreendida o mais amplamente como atividade comunicativa, não se limita exclusivamente ao texto escrito. O texto é urdido através de um sistema de signos denominado língua e o estudo da língua é objeto da Lingüística. Esse é o ponto de intersecção entre as duas vertentes da Filologia Textual. A relação grafemático-fonética, por exemplo, leva a duas considerações relativas ao comportamento metodológico: a necessidade de se fazerem lições conservadoras nas edições dos textos manuscritos, a possibilidade de que tais lições permitem fazer-se uma descrição fonológica a partir da scripta dos textos. Nessa direção, Roger Lass (1997:45) relembra as mais importantes informações fornecidas pela scripta de um texto: a natureza do sistema de escrita e as suas possibilidades de representação, o aspecto fonético e outras espécies de evidência do sentido dos grafos nos textos antigos, a implicação histórica do conservatismo dos sistemas de escrita face às mudanças, o uso das evidências métrica e rímica, o testemunho dos foneticistas e gramáticos pré-modernos, os problemas suscitados pela divisão de palavras e outras convenções, o uso de algumas fontes como glossários e transcrições interlineares.
Esses elementos da scripta são os indícios que não podem ser esquecidos pelo filólogo, porque são eles que permitem o uso do texto para compreensão do momento cultural representado pelo texto (e pelo seu autor). Vale destacar, entretanto, que o mais importante é que se usem textos fidedignos, não nos esquecendo de que enquanto não dispomos de um texto fidedigno, todas as operações hermenêuticas e críticas podem tornarse arbitrárias, intempestivas e inseguras (Tavani, 1988:53).
Os critérios de transcrição e de reprodução adotados devem levar em conta a especificidade dos manuscritos estudados, bem como a necessidade de se tornar esta transcrição o mais rigorosa e inequívoca possível, respeitando o movimento da escrita, suas hesitações, seus equívocos e as marcas dos incidentes caligráficos (Reis, Milheiro, 1989: 201). Por outro lado, no campo das transcrições de inquéritos lingüísticos gravados recomenda-se o estabelecimento do texto através da chamada transcrição grafemática, buscando reproduzir fielmente a variante lingüística registrada. Como lembra L. A. Marcuschi (2001:47), a passagem da fala para a escrita não é a passagem do caos para a ordem, mas a passagem de uma ordem para outra ordem. Assim, em qualquer hipótese, não devemos interferir na transcrição do texto.
O Grupo de Filologia Românica da Universidade Federal da Bahia, dando continuidade às pesquisas que vem desenvolvendo nesses últimos anos tem trabalhado na intersecção dessas duas vertentes. É assim que vem conciliando a interface de duas linhas de pesquisa, Mudanças lingüísticas na România e Crítica Textual. Na primeira privilegia para texto-fonte edições críticas, na segunda prepara edições de textos na perspectiva de lições conservadoras que possibilitem a melhor utilização do texto em estudos subseqüentes.
TELLES, Célia Marques; GAMA, Albertina Ribeiro da. Perspectiva da filologia textual. 2002.
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