LINGÜÍSTICA TEXTUAL


Atualmente, tomar-se o texto como unidade de análise no campo dos estudos da linguagem pode parecer pouco questionável ou, mais ainda, constituir-se em uma verdadeira necessidade. No entanto, esta idéia nem sempre foi bem aceita: houve um percurso de mais de 30 anos desde que o termo "Lingüística de Texto" foi empregado pela primeira vez por Harald Weinrich, autor alemão que postula toda a Lingüística ser necessariamente Lingüística de Texto. 

Sem dúvida, o surgimento dos estudos sobre o texto faz parte de um amplo esforço teórico, com perspectivas e métodos diferenciados, de constituição de um outro campo (em oposição ao campo construído pela Lingüística Estrutural), que procura ir além dos limites da frase, que procura reintroduzir, em seu escopo teórico, o sujeito e a situação da comunicação, excluídos das pesquisas sobre a linguagem pelos postulados dessa mesma Lingüística Estrutural - que compreendia a língua como sistema e como código, com função puramente informativa. 

Ingedore Koch (1994), em seu texto Lingüística Textual: retrospecto e perspectivas e Luiz Antônio Marcuschi (1998a) em sua conferência intitulada Rumos atuais da Lingüística Textual, pronunciada no LXVI Seminário do Grupo de Estudos Lingüísticos do Estado de São Paulo, em junho de 1998, enumeram os estudos de diversos autores', principalmente nos Estados Unidos e na Europa, como aqueles que constituíram a primeira geração que propunha o texto como uma unidade legítima dos estudos lingüísticos e dava uma guinada no tratamento da língua. Denise Maldidier, Claudine Norman e Régine Robin, em texto da década de setenta, intitulado Discurso e ideologia: bases para uma pesquisa, apresentam um breve histórico da constituição do campo dos estudos do discurso na França, discutindo resumidamente os interesses e os problemas das abordagens semiológicas (Roland Banhes, Greimas), das pesquisas sobre as pressuposições (Oswald Ducrot) e da elaboração do conceito de enunciação (Émile Benveniste), para então apresentarem os interesses da chamada Análise do Discurso de linha francesa. Todas essas abordagens podem ser vistas como fazendo parte deste esforço teórico, iniciado na década de sessenta, de construir uma Lingüística para além dos limites da frase, a chamada "Lingüística do Discurso". Ao longo desta apresentação, tentaremos apontar algumas diferenças importantes entre as tradições anglo-saxônica e francesa de estudos sobre o discurso/texto'.

 Na história da constituição do campo da Lingüística de Texto, podemos afirmar que não houve um desenvolvimento homogêneo. Segundo Marcuschi (1998a), "seu surgimento deu-se de forma independente, em vários países de dentro e de fora da Europa Continental, simultaneamente, e com propostas teóricas diversas"4. Mas, de uma forma geral, é possível distinguir três momentos que abrangeram preocupações téoricas bastante diversas entre si. 

Não há consenso entre os autores de que houve uma certa cronologia na passagem de um momento para outro. Podemos afirmar, no entanto, que houve não só uma gradual ampliação do objeto de análise da Lingüística Textual, mas também um progressivo afastamento da influência teórico-metodológica da Lingüística Estrutural saussureana: em um primeiro momento, o interesse predominante voltava-se para a análise transfrástica, ou seja, para fenômenos que não conseguiam ser explicados pelas teorias sintáticas e/ou pelas teorias semânticas que ficassem limitadas ao nível da frase; em um segundo momento, com a euforia provocada pelo sucesso da gramática gerativa, postulou-se a descrição da competência textual do falante, ou seja, a construção de gramáticas textuais; em um terceiro momento, o texto passa a ser estudado dentro de seu contexto de produção e a ser compreendido não como um produto acabado, mas como um processo, resultado de operações comunicativas e processos lingüísticos em situações sociocomunicativas; 2 parte-se, assim, para a elaboração de uma teoria do texto. Falemos agora um pouco mais detalhadamente de cada um destes momentos. 

Na análise transfrástica, parte-se da frase para o texto. Exatamente por estarem preocupados com as relações que se estabelecem entre as frases e os períodos, de forma que construa uma unidade de sentido, os estudiosos perceberam a existência de fenômenos que não conseguiam ser explicados pelas teorias sintáticas e/ou pelas teorias semânticas: o fenômeno da co-referenciação5, por exemplo, ultrapassa a fronteira da frase e só pode ser melhor compreendido no interior do texto. Antes de passarmos à análise do exemplo a seguir, faz-se necessário observar que neste primeiro momento de constituição da Lingüística Textual, um dos principais conceitos de texto era o de Harweg (1968), afirmando que um texto era "uma seqüência pronominal ininterrupta' e que uma de suas principais características era o fenômeno do múltiplo referenciamento'. Um outro conceito de texto importante era o de Isenberg (1970): um texto era definido como uma "seqüência coerente de enunciados".


BENTES, Anna Christina. Linguística textual. Introdução à linguística: domínios e fronteiras, v. 1, n. 4, 2001.


Ficou curios@?

Acesse:
https://d1wqtxts1xzle7.cloudfront.net/32896943/BENTES-_Linguistica_Textual-with-cover-page-v2.pdf?Expires=1639508424&Signature=IscTUyU24ijEKDwODRJVlJFVYkXjYXiJML6xG4~~dUFDaKMQozgA3lsl9yeI49bamwUbyhL8UQtXZ8tthV3RQ8DgHZRZPTJ6hhe9ksWKyettoKURudEfKSfOo41J0BP4zQvCY4yNQvikJnsuaZcsIxQQ7VRzpAGIL5Nk7qg2t4FTgb4jS9jliudlwhREzzBTTCR69ajMgGnahNMldDlmHsn0xMWYLcvx7Hvc9Zftawcm4WhJzT-i63wAXEdzLqhRmgZfF-tEDdt2KoCMvNT77y1mk98ffmDYFBxh0mA-jwQtDmJI-cxG4cucKdhEEpBd-W0gHdgquoT5VomFqQI-Ww__&Key-Pair-Id=APKAJLOHF5GGSLRBV4ZA



Comentários