RESENHA: ALDEOTA (Jáder de Carvalho)

Preatecianos, Tradicianos e interessados,

A partir de hoje abrimos um espaço em nosso blog para a publicação de resenhas de livros. 
As resenhas podem ser de obras literárias e ou acadêmicas que abrangem as áreas de estudo do grupo de pesquisa PRAETECE (Filologia, Literatura, Linguística Aplicada, Linguística, História, Sociologia etc.) e devem ser enviadas para aprovação através do e-mail praetece@uece.br

Divulgamos aqui a primeira resenha de autoria do Prof. Dr. Expedito Eloísio Ximenes:

ALDEOTA 
de Jáder de Carvalho
Resenhado por Expedito Eloísio Ximenes

O romance Aldeota de Jader de Carvalho tem sua edição princeps em 1963. Mais recentemente a Fundação Demócrito Rocha fez a segunda edição, mas ainda é uma obra muito desconhecida do público.
O romance traz como enredo principal a história de Chicó, personagem central, desde suas origens humildes no interior do Ceará até sua ascensão como empresário em Fortaleza.
 A narrativa começa em Saboeiro, cidade cearense da região dos Inhamuns, passando por São Mateus (atualmente Jucás), depois Iguatu, Juazeiro do Norte e Fortaleza. O personagem faz uma curta viagem à Parnaíba, no Piauí, onde se desenvolve parte da narrativa.  Volta à Fortaleza, passando pela cidade de General Sampaio, no Ceará, onde Chicó trabalha na construção do açude público no período da seca. Depois vai para o Amazonas trabalhar na produção da borracha, nas margens dos rios da Amazônia. Regressa à Fortaleza e se estabelece novamente, tornando-se empresário rico com a exportação e a importação de vários produtos.
O fluxo narrativo segue o personagem Chicó. Desde criança era um andarilho, não conseguia se fixar em lugar nenhum, sempre inquieto, trabalhou como comboieiro, tangendo os animais com cargas para a feira do Iguatu. Em São Mateus, prestava pequenos serviços para as pessoas ilustres da vila. Foi morar em Juazeiro, como artesão e vendedor de joias, tornando-se ourives profissional. Ali teve contato com personagens da história do Ceará como Floro Bartolomeu e Padre Cícero no período das grandes romarias. Em Fortaleza, teve vários serviços. Depois vai para o Piauí trabalhar nas balsas do rio Parnaíba. Regressa ao Ceará e vai trabalhar na construção do açude General Sampaio. Entrou no exército e foi para Belém. Volta ao Ceará e depois vai trabalhar nos seringais do Amazonas, onde fica dez anos e aprende o comércio ilegal. De volta à Fortaleza, casado com Katarina (Katá), uma paraense, filha de portugueses, fixa-se no bairro Benfica, depois torna-se empresário de sucesso e vai morar na Aldeota.
 A narrativa do romance é leve, não há um enredo pesado. São várias histórias curtas que começam e terminam em vários núcleos narrativos. O único fio condutor é Chicó.
 Em Saboeiro tem um núcleo narrativo com seus personagens que saem de cena com a saída do protagosnista. O mesmo ocorre em São Mateus e em Juazeiro. Várias histórias entrelaçadas, mas todas se desenrolam com brevidade, pois a narrativa dá vários saltos, resolvendo todos os conflitos. Em Juazeiro do Norte, até Padre Cícero e Floro Bartolomeu são personagens que atuam no romance.
Em Fortaleza entram outras personagens. No Amazonas, nos seringais, há outro núcleo e novas personagens que convivem sem grandes problemas. A volta de Chicó ao Ceará estabelecido no bairro Aldeota é o ponto central da trama. Pois a história passa a ser a constituição desse bairro de Fortaleza, a elite que ali se instaura com seus casarões, suas riquezas e seu luxo sustentados pelo comércio ilegal, pela sonegação de impostos e pelo contrabando. Chicó é um desses empresários que vive conjuntamente com um grupo a fazer esse tipo de comércio. Vê-se uma crítica pesada à riqueza e ao luxo ostentado pela corrupção. A elite fortalezense se formou assim com a cobertura da justiça, da imprensa, da polícia e dos órgãos públicos fiscalizadores que faziam vista grossa para essa situação.
Há outro foco que se direciona para o bairro Pirambu, que com a orientação da igreja, denuncia a situação de miséria e de desigualdade social, reivindicando melhorias. Isso é uma ameaça para a elite da Aldeota e para os que sustentam o poder. Os personagens da Aldeota tentam justificar a sua riqueza construída na imoralidade de suas ações ilícitas e manter a assimetria entre as classes sociais.
 No meio da história, destaca-se Katarina, moça simples, que veio de Belém, casada com Chicó, mas fez escola normal, por isso lê muito e começa a se atentar na riqueza do marido e a questionar aquela situação. Houve uma passeata do povo do Pirambu para o centro da cidade e Katarina foi acompanhando para ver de perto as reivindicações e compreender a situação. Ela também foi a uma fazenda de algodão em Morada Nova para conhecer a realidade dos agricultores e denuncia a situação em suas memórias, mostrando como o pequeno agricultou era enganado e injustamente tratado.
 O narrador passa a palavra à Katarina que registra várias situações de suas percepções da vida e da realidade em que vivia com um tom crítico e insatisfeita.
 Chicó, menino pobre do sertão, ganha a vida com muito esforço. Transforma-se em empresário de sucesso por meio de fraudes, esquecendo sua situação inicial. Torna-se proprietário de casarões na Aldeota, carros, empresas e tem uma vida social agitada, viaja para o exterior, vive na alta sociedade. Toda a narrativa começa e termina focando essa personagem. Das margens do rio Jaguaribe, Chicó vai trabalhar no rio Parnaíba e depois vai para os seringais ás Margem dos rios Purus e Juruá na Amazônia; serpenteia o Ceará por quase todo o sertão e litoral, se encaminha pelo norte do Brasil subindo a Amazônia em busca de viver, retorna ao Ceará e se estabelece no litoral, como comerciante da praia. Em torno de Chicó muitas histórias, muitas personagens o seguem e o rejeitam.
O personagem principal assemelha-se a um rio com seu movimento de andanças a subir e a descer desfiladeiros sempre na insegurança das altas e das baixas cheias até desaguar no oceano. Arrasta consigo aqueles que lhe são afeitos e deixa para trás tudo quanto não tem mais importância. É uma vida de desbravura e de abertura de novos caminhos sempre insatisfeito com o que tem e buscando mais. O oceano é seu limite é ali que ele se estabelece para completar sua riqueza e viver o fim dos seus dias, assim como o rio que após todo o percurso descansa sua carga no grande mar.

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